Voltei ao livro Longe da Árvore, de Andrew Solomon, para continuar sua resenha por capítulos.
Este capítulo sobre surdos descreve as relações familiares e a forma como a sociedade – majoritariamente ouvinte – percebe os surdos.
Algumas agressões da sociedade aos surdos ao longo da história:
- No século XIX, Alexandre Graham Bell, que era filho ouvinte de mãe surda e casado com uma mulher surda depreciava os sinais da língua delas. Ele fundou uma associação “educativa” que condenava o casamento entre surdos e o contato entre alunos surdos! Bell defendia a esterilização de todos os surdos! Thomas Edison também aderiu ao movimento para extinguir a língua de sinais.
- O movimento contra a língua de sinais culminou, em 1880, no Congresso de Milão – primeiro encontro internacional de educadores de surdos – que decretou a proibição da língua de sinais, chamada pejorativamente de “manualismo”.
- Antes do Congresso de Milão havia escolas residenciais para surdos aprenderem a língua de sinais.
- Na época da primeira Guerra Mundial 80% da crianças surdas eram educadas sem a língua de sinais e tomavam reguada na mão se tentassem se comunicar dessa forma.
- Os surdos eram considerados idiotas, por isso, na língua inglesa, a palavra dumb (mudo) se refere a uma pessoa pateta.
O reconhecimento da língua de sinais no século XX e no século XXI:
- Quando o linguista William Stokoe publicou “A estrutura da língua gestual”, em 1960 (!) os estudiosos reconheceram sua gramática própria, complexa e profunda, com regras e sistemas lógicos. Até então, a língua de sinais era considerada um sistema grosseiro de comunicação gestual.
- A língua de sinais brasileira (Libras) só foi reconhecida por lei como uma língua em 2002!!!
Sobre aquisição da linguagem:
“As crianças surdas adquirem a língua de sinais da mesma maneira como as crianças que ouvem adquirem a língua falada; a maioria pode aprender a linguagem sonora escrita como uma segunda língua. Para muitas, no entanto, a fala é uma ginástica mística da língua e da garganta, enquanto a leitura labial é um jogo de adivinhação.”
“Se passarem da idade-chave para a aquisição da linguagem sem adquirir alguma língua por completo, elas não poderão desenvolver habilidades cognitivas plenas e sofrerão permanentemente uma forma evitável de retardo mental.”
“Não podemos imaginar pensamento sem linguagem, tanto quanto não podemos imaginar linguagem sem pensamento. A incapacidade de se comunicar pode resultar em psicose e disfunção.”
FILHOS SURDOS DE PAIS SURDOS:
“Filhos surdos de pais surdos com frequência têm um grau maior de realização do que filhos surdos de pais ouvintes.”
Juntando a afirmação acima com outras informações do livro:
“Em média, a criança de dois anos que ouve tem um vocabulário de trezentas palavras; a criança surda de pais ouvintes da mesma idade tem um vocabulário de trinta palavras.”
“A cultura surda proporciona um caminho para as pessoas surdas se reinventarem, não tanto se adaptando ao presente, mas herdando o passado. Ela possibilita que os surdos pensem em si mesmos não como pessoas com audição inacabada, mas como seres culturais e linguísticos em um mundo coletivo com os outros.”
Tudo leva a crer que é mais fácil ser surdo e ter pais surdos do que ter pais ouvintes porque o contato com a língua de sinais e com a cultura surda desde cedo são muito importantes para o desenvolvimento da criança surda.
COMO FICAM AS FAMÍLIAS DE PAIS OUVINTES E FILHOS SURDOS?
A língua de sinais e a cultura surda distanciariam os pais ouvintes dos filhos surdos?
Talvez sim. Por essa razão, muitos pais ouvintes procuram outros caminhos para os filhos, como o implante coclear.
“O implante coclear não permite que se ouça, mas possibilita algo que se assemelha à audição. Dá à pessoa um processo que é (às vezes) rico em informações e (em geral) desprovido de música. Implantado desde cedo, pode proporcionar uma base para o desenvolvimento da linguagem oral.”
Além de possíveis reações adversas e complicações na cirurgia do implante coclear, ele proporciona apenas versões dos sons que os ouvintes escutam.
O autor alerta outro risco para aqueles que optam pelo implante coclear dos filhos:
“… algumas crianças com implantes não expostas à língua de sinais porque se espera que desenvolvam a fala, podem cair na assustadora categoria dos desnecessariamente prejudicados, que têm uma língua principal escassa.”
“Embora possa ser difícil para as pessoas surdas aprender a falar, também é difícil para os pais aprender a língua de sinais – não porque sejam preguiçosos ou presunçosos, mas porque seus cérebros estão organizados em torno da expressão verbal … Um dos motivos que levam os pais a fazer implantes nos filhos é para que possam se comunicar com eles. Talvez seja sábio fazê-lo: a intimidade entre pais e filhos é um dos pilares da saúde mental para ambas as partes.”
Por muitas histórias tristes, traumáticas e outras felizes e cheias de superação, o autor trata das dificuldades de escolher o caminho que ajudará os filhos e os pais a serem mais próximos e a se sentirem integrados como família e como indivíduos pertencentes a uma cultura ouvinte e/ou surda.
Espero que vocês tenham gostado das reflexões deste capítulo.
As lindas ilustrações deste post foram tiradas de um trabalho da professora de aquarela do Jardim Botânico do Rio de Janeiro Maria Angélica de Sá Earp.
Até o próximo!!!
Excelentes textos. Tenho aprendido muito.
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Eu fico muito feliz! Tive um excelente professor! Beijos
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Muito interessantes os tópicos apresentados.
Parabéns pela resenha…
Aguardo, ansiosamente, os próximos capítulos.
Até breve!
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Obrigada!!! Bjos
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Eu estou chocado. Com o passado. Com o presente. Com a minha ignorância… Será que não seria benéfico, tanto individualmente quanto socialmente, que a cultura surda fosse integrada na educação de todas as crianças?
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Oi Jauch. Eu também não conhecia a cultura surda, nem sabia que existe uma língua de sinais diferente em cada país. Só fui tomar conhecimento do assunto porque Libras era uma das matérias da minha segunda faculdade. Seria legal incluir no currículo escolar das escolas de crianças ouvintes a língua de sinais para ampliar a visão sobre essa outra cultura. O mundo é tão diversificado e a gente está sempre com o foco no que é igual ou parecido, né? Muito obrigada por refletir e comentar aqui! Bjos
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Espero, sinceramente, que consigamos superar as diferenças e trabalhar pelo bem comum. Mas não está fácil manter as esperanças…
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Muito interessante! Sempre existiu e existirá pessoas que olham para a sociedade e pessoas que olham para o seu particular. Beijins
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Oi Claudia. É verdade. Obrigada por comentar sobre o assunto. Vi que você faz trabalho voluntário com pessoas cegas e achei muito legal sua iniciativa 🌹Beijos!!!🌸🌻🌸🌻
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Sim, o voluntariado é sempre bom para os dois lados: para quem faz e para quem recebe! O seu texto me fez lembrar das dificuldades dos cegos, e o quanto eles precisam de ajuda! Beijins !
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💝 Obrigada! Beijos, querida.💝🌻🌸🌷
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Não conhecia essas informações que você trouxe, fico feliz por conhecer mais sobre o assunto, agora. Como a sociedade era primitiva no final do século XIX e início do XX! Ainda bem que evoluímos em vários aspectos. Ótimo post.
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Ainda bem, né? Obrigada, Alan👍
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Oi Carmem, foi uma surpresa e uma alegria
enorme ver minhas ilustrações no blog da Mariana.
Gostei muito do texto. Geralmente pensamos pouco sobre
as dificuldades que os surdos sentem ao enfrentar o nosso mundo de ouvintes
e falantes normais. Aprendi muito com as essas informações.
A Mariana está de parabéns. Agradeça a ela por mim. Estou muito orgulhosa
de fazer parte de um trabalho tão bonito.
Beijos para vocês e muito obrigada pelo carinho.
M, Angélica.
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Oi Angélica! Que bom que você gostou de ver suas lindas ilustrações aqui! Muito obrigada! Beijos
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Muito legal o teu post! Para acompanhar tirinhas relacionadas à surdez basta clicar no link: https://www.facebook.com/dmescritos
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Obrigada Diogo! Vou acompanhar.😁😊🌻
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